terça-feira, 30 de outubro de 2012

Proteína de planta nativa tem atividade antitumoral


Pesquisadores do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) estão desenvolvendo estudos com a pulchellina, uma proteína extraída das sementes da Abrus pulchellus, espécie de trepadeira nativa no País, encontrada no nordeste brasileiro e também na África. Os estudos in vitro mostraram que a pulchellina apresenta uma atividade tóxica celular, interferindo na síntese de proteínas. Outra particularidade é que ela leva à apoptose, que é a morte celular programada.
Essas características fazem dela uma candidata ao desenvolvimento, no futuro, de fármacos dirigidos ao tratamento de tumores, principalmente os superficiais (de pele). Os estudos estão sendo conduzidos pelo Grupo de Biofísica Molecular “Sérgio Mascarenhas”, do IFSC, sob a coordenação da professora Ana Paula Ulian de Araújo, com participação da professora Leila Maria Beltramini, do IFSC, além de outros três pesquisadores, técnicos e alunos de pós-graduação.

A pulchellina é considerada uma proteína inativadora de ribossomos (locais de síntese de proteínas dentro das células) do tipo 2 (RIP tipo 2). “A ricina, encontrada na mamona, e a abrina, encontrada na Abrus precatorius, pertencem à mesma família e podem ser consideradas como outros exemplos mais conhecidos dessa família de RIPs tipo 2”, conta a professora Ana Paula.

A pesquisadora explica que os primeiros estudos começaram a ser realizados há cerca de dez anos, quando o pesquisador Renato de Azevedo Moreira, da Universidade Federal do Ceará, forneceu algumas sementes da planta para pesquisa.

Ao longo deste tempo, foi possível realizar alguns estudos básicos sobre a pulchellina, como os de caracterização da citotoxicidade da proteína, bem como o isolamento e a identificação de isoformas. “Identificamos quatro isoformas mais viáveis para aplicação em pesquisas, sendo que algumas são mais tóxicas que outras”, diz a professora.



Moléculas recombinantes

A molécula da pulchellina apresenta duas partes. Uma é responsável pelas atividades de toxicidade. A outra, responde pelo mecanismo que permite a sua entrada dentro das células. “Estamos trabalhando tanto com a proteína nativa, extraída e purificada diretamente da planta, como também com as duas partes isoladamente, obtidas por meio de engenharia genética”, explica. “Neste processo, o gene da planta foi isolado e introduzido em uma bactéria para esta célula produzir as partes da proteína em um meio de cultura apropriado. Estas novas moléculas são chamadas de recombinantes”, conta.
Atualmente, os pesquisadores contam com a parceria de uma empresa de biotecnologia de Campinas, onde estão sendo realizados estudos in vitro e em animais com o objetivo de desenvolver uma formulação que permita a entrada da cadeia tóxica da pulchellina dentro da célula tumoral sem afetar as demais. “A ideia é que uma vez desenvolvida a nanoestrutura e a formulação, a toxina poderá ser utilizada sobre tumores localizados superficialmente”, diz a professora.
O projeto para aplicação biotecnológica da pulchellina está em andamento e encontra-se em fase de avaliação da eficácia do sistema tanto in vitro como in vivo. A pesquisa tem apoio do Programa de Formação de Recursos Humanos em Áreas Estratégicas (RHAE) do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).


segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Mecanismo de defesa antioxidante de bactérias é desvendado


Por Karina Toledo
Agência FAPESP – Quando bactérias patogênicas invadem o corpo humano ou de outros mamíferos, as células hospedeiras liberam substâncias tóxicas para tentar se livrar da presença indesejada. Uma nova pesquisa, feita na Universidade de São Paulo (USP), desvendou um dos mecanismos pelos quais certos tipos de bactérias se defendem desse ataque. Os resultados, publicados este mês na PLoS One, abrem caminho para a descoberta de moléculas capazes de inibir o sistema de defesa bacteriano e dificultar o avanço da infecção. A pesquisa, apoiada pela FAPESP, foi feita com a Chromobacterium violaceum, microrganismo que afeta principalmente o fígado e a pele de indivíduos com o sistema imunológico comprometido. “A C. violaceum é uma bactéria oportunista. Pretendemos explorá-la como modelo para estudar patogenicidade porque ela já teve seu genoma sequenciado e é relativamente fácil manipulá-la geneticamente”, explicou Luis Eduardo Soares Netto, supervisor do estudo de pós-doutorado de José Freire da Silva Neto, que deu origem ao artigo.
Os cientistas investigaram o mecanismo de produção de uma enzima usada pela bactéria para decompor o peróxido orgânico, substância oxidante liberada pelas células hospedeiras após a invasão. “O peróxido orgânico causa estresse oxidativo na bactéria, o que dificulta sua reprodução e pode levá-la à morte. Para se defender, o patógeno produz uma enzima antioxidante chamada Ohr. A produção dessa enzima, por sua vez, é regulada por outra proteína – que atua como fator de transcrição – chamada OhrR”, contou Netto.
Quando a bactéria está em condição basal, a proteína OhrR fica ligada ao gene responsável pela produção da enzima Ohr. “Dessa forma, impede que o DNA seja transcrito em RNA e que a enzima seja produzida”, disse. Mas, ao entrar em contato com o peróxido orgânico, a OhrR se oxida e se desliga do DNA, permitindo a produção da enzima antioxidante. “Depois que a Ohr cumpre seu papel de decompor o peróxido orgânico, outra enzima chamada tiorredoxina entra em ação para fazer com que o fator de transcrição OhrR se ligue novamente ao gene e iniba a produção de Ohr”, explicou Netto. Esse mecanismo de defesa também está presente em outros gêneros de bactérias, como Streptococcus e Pseudomonas – ambos causadores de doenças respiratórias, infecções cutâneas e sepse em humanos. Também está presente em fitopatógenos como a Xylella fastidiosa, que causa nas laranjeiras a doença clorose variegada de citros, popularmente conhecida como praga do amarelinho.
Driblando a defesa
“Agora que sabemos como a bactéria se defende, podemos pensar em meios para driblar esse mecanismo. Uma possibilidade seria inibir a produção da enzima Ohr. Outra seria ativar a produção de OhrR, para anular o sistema antioxidante”, disse Netto. O primeiro passo, segundo o pesquisador, seria demonstrar experimentalmente em camundongos que essas manobras genéticas realmente tornariam mais fácil para o organismo hospedeiro combater a bactéria.
Os testes ainda estão sendo padronizados, mas a ideia é silenciar os genes da Ohr e da OhrR na C. violaceum e avaliar se isso altera sua capacidade de infectar os animais. “Como não existem homólogos da Ohr e da OhrR em mamíferos ou plantas, se conseguirmos desenhar uma molécula que atue sobre essas proteínas, ela teoricamente teria ação específica sobre a bactéria, sem efeito colateral para o hospedeiro”, afirmou Netto.
Embora ainda em fase preliminar, os estudos abrem caminho para o desenvolvimento de novos medicamentos. “Hoje já se sabe que muitos antibióticos têm como mecanismo de ação a geração de estresse oxidativo nas bactérias. Essa questão está ganhando força”, disse. O estudo de pós-doutorado está vinculado ao Projeto Temático “Aspectos biológicos de tióis: estrutura proteica, defesa antioxidante, sinalização e estados redox” , coordenado por Netto. Também está ligado ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) de Processos Redox em Biomedicina (Redoxoma). 

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Licopeno diminui o risco de derrame em homens

Resumo dos autores: Objetivo: O consumo de frutas e vegetais e os níveis de carotenóides séricos têm sido associados com diminuição do risco de acidente vascular cerebral, mas os resultados têm sido inconsistentes. O objetivo do presente estudo foi examinar se as concentrações séricas de carotenóides importantes, [alfa]-tocoferol e retinol, estão relacionados com qualquer traço AVC isquêmico e nos homens.
Métodos: A população de estudo consistiu de 1.031 homens finlandeses com idades entre 46-65 anos, na doença cardíaca isquémica Kuopio coorte fator de risco. As concentrações séricas de carotenóides e retinol [alfa]-tocoferol foram medidos por cromatografia de alta performance de líquido. A associação entre as concentrações séricas de licopeno [alfa]-caroteno, [beta]-caroteno, [alfa]-tocoferol, e retinol e o risco de acidentes vasculares cerebrais foram estudados, utilizando modelos de riscos proporcionais de Cox.

Resultados: Um total de 67 cursos ocorreu, e 50 destes foram acidentes isquêmicos cerebrais durante uma média de 12,1 anos de acompanhamento. Após o ajuste para idade, anos de exame, IMC, pressão arterial sistólica, tabagismo, níveis séricos de lipoproteína de baixa densidade colesterol, diabetes e histórico de derrame, os homens no quartil mais alto de concentrações séricas de licopeno tiveram 59% e 55% menores riscos de acidente vascular cerebral isquêmico e qualquer acidente vascular cerebral, em comparação com os homens no quartil mais baixo (hazard ratio [HR] = 0,45, intervalo de confiança de 95% [IC] 0,25-0,95, p = 0,036 para qualquer curso e HR = 0,41, 95% CI 0,17-0,97, p = 0,042 para AVC isquêmico). [Alfa]-Caroteno, [beta]-caroteno, [alfa]-tocoferol, retinol e não estiveram relacionados com o risco de acidentes vasculares cerebrais.

Conclusões: Este estudo prospectivo mostra que altas concentrações séricas de licopeno, como um marcador de consumo de tomates e produtos à base de tomate, diminuir o risco de acidente vascular cerebral qualquer curso e isquêmica em homens.

Artigo disponível para assinantes em: Serum lycopene decreases the risk of stroke in men: A population-based follow-up study Karppi, Jouni PhD; Laukkanen, Jari A. MD, PhD; Sivenius, Juhani MD, PhD; Ronkainen, Kimmo MSc; Kurl, Sudhir MD

GLOSSÁRIO: 
IMC: índice de massa corporal
IC: intervalo de confiança 
FINMONICA: parte finlandesa de Monitoramento das Tendências e Determinantes em Doenças Cardiovasculares 
HPLC: maior cromatografia líquida
HR: taxa de risco 
CID-9: Classificação Internacional de Doenças, revisão 9 
KIHD: Kuopio isquémica cardíaca Fator de Risco de Doenças 
LDL: lipoproteína de baixa densidade 
ROS: espécies reativas de oxigênio 
PAS: pressão arterial sistólica

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Molécula protege neurônios em condições de isquemia


Por Karina Toledo
Agência FAPESP – Em artigo publicado na revista PLoS One, um grupo de pesquisadores do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (IQ-USP) demonstrou que a bradicinina – peptídeo com conhecida ação anti-hipertensiva – é capaz de reverter o processo de morte celular em condições que ocorrem durante uma isquemia cerebral. A pesquisa foi feita em colaboração com cientistas de Porto Rico.
“Quando há oclusão das artérias e o fluxo de oxigênio é interrompido, as células morrem e liberam uma substância chamada glutamato. Isso estimula os receptores de glutamato, inclusive aqueles do tipo NMDA (N-metil D-Aspartato) em células vizinhas, permitindo a entrada de cálcio na célula de forma descontrolada”, explicou Alexander Henning Ulrich, coordenador do Projeto Temático apoiado pela FAPESP.
Quando esse excesso de cálcio atinge a mitocôndria, estimula a formação de espécies reativas de oxigênio e induz programas de apoptose, uma espécie de suicídio celular.
“Em experimento feito com ratos, a bradicinina conseguiu reverter o processo de apoptose. Isolamos cortes de uma região do cérebro desses animais, o hipocampo, e colocamos em uma solução fisiológica. Em seguida, fizemos uma estimulação elétrica com eletrodos e medimos a atividade neuronal”, disse Ulrich.
Para simular o que ocorre no cérebro após uma isquemia, os pesquisadores trataram o tecido com NMDA, causando uma invasão de cálcio nas células. A medição da atividade neuronal feita em seguida mostrou que 80% dos neurônios piramidais do hipocampo haviam iniciado o processo de apoptose. Mas, quando o tecido cerebral recebeu bradicinina após a exposição ao NMDA, a maioria das células foi resgatada da morte.
“Ainda estamos investigando qual é exatamente o mecanismo que confere à bradicinina esse efeito neuroprotetor. Nossa hipótese é que ocorre a ativação de uma sinalização que interrompe o processo de apoptose”, disse Ulrich.
Apesar dos resultados promissores, de acordo com o pesquisador é pouco provável que a bradicinina possa ser usada para tratar isquemia cerebral. Alguns estudos indicam que subprodutos resultantes da degradação da molécula, tais como a des-arg9-bradicinina, poderiam induzir efeitos adversos, agravando os danos causados pela isquemia.
“Nosso objetivo é descobrir uma substância análoga à bradicinina que tenha o efeito neuroprotetor sem as reações indesejadas”, disse.
Versátil
A bradicinina foi isolada há mais de 50 anos por pesquisadores brasileiros. Eles observaram que o veneno da cobra jararaca-da-mata (Bothrops jararaca) aumentava a presença desse peptídeo no sangue de mamíferos.
As substâncias responsáveis pelo aumento da concentração da bradicinina – denominadas peptídeos potencializadores da bradicinina (BPPs) – serviram de base para o desenvolvimento do captopril e de toda uma classe de medicamentos anti-hipertensivos.
No Temático coordenado por Ulrich, o objetivo é descobrir novos usos para a molécula. A equipe verificou em modelos celulares in vitro que a substância estimula a neurogênese, ou seja, faz com que células-tronco do cérebro se transformem em novos neurônios. A descoberta abre caminho para novos tratamentos para doenças degenerativas, como Alzheimer e Parkinson.
Em outro experimento feito com ratos modelos da doença de Parkinson, Ulrich e a pesquisadora Telma Tiemi Schwindt Diniz Gomes, professora do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, conseguiram reverter quadros semelhantes aos que ocorrem em pacientes com Parkinson em estágio avançado.
Os resultados foram apresentados durante a 27ª Reunião Anual da Federação de Sociedades de Biologia Experimental (FeSBE), realizada em Águas de Lindoia no mês de agosto.
“Induzimos a morte dos neurônios dopaminérgicos em um dos hemisférios dos animais e eles passaram a apresentar falhas motoras, observadas como comportamento rotacional após a indução do sistema dopaminérgico por apomorfina”, contou Ulrich.
“Cinquenta e seis dias após a administração da bradicinina, o comprometimento da função motora foi revertido na maioria dos animais. A análise histológica sugere que, de fato, a melhora foi causada pela neurogênese induzida pela droga”, afirmou.
Leia mais sobre os efeitos da bradicinina sobre a neurogênese em reportagem na revistaPesquisa FAPESP